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Agropecuarista e diretora do Sicoob indiciados por estelionato na compra e venda de imóveis

O agropecuarista Thiago da Matta Fagundes, preso desde outubro de 2024, uma diretora operacional do Sicoob (Sistema de Cooperativas de Crédito do Brasil) e outras nove pessoas — familiares e sócios de Thiago — foram indiciados por envolvimento em um esquema de estelionato. Conforme aponta o inquérito, Thiago vendeu glebas de terra que já estavam gravadas por dívidas milionárias e, ao mesmo tempo, as usou como garantia em operações financeiras com o Sicoob Unicentro Norte Brasileiro. O grupo responde pelos crimes de organização criminosa, lavagem de dinheiro, falsificação e uso de documento público, fraude processual e estelionato.

O relatório final do Inquérito Policial nº 269/2023 foi emitido pela 4ª Delegacia Distrital de Polícia Civil de Goiânia. O Jornal Opção teve acesso ao documento, que foi obtido com exclusividade pelo Portal Compre Rural.

Em nota, a defesa de Thiago da Matta Fagundes informou que só irá se manifestar após análise da conclusão do inquérito para preservar a lisura do processo. A reportagem não conseguiu contato com a defesa dos demais citados em nem com o Sicoob Unicentro Norte. O espaço fica aberto para esclarecimentos.

Agropecuarista Thiago da Matta Fagundes | Foto: Divulgação/PC-GO
Agropecuarista Thiago da Matta Fagundes | Foto: Divulgação/PC-GO

As investigações começaram em dezembro de 2023, após denúncia por conta da negociação da Fazenda Cana Brava, em Porangatu. O denunciante foi o empresário que comprou as terras, somando 1.209 hectares e avaliadas em R$ 34 milhões. A transação previa que parte do montante pago pelo empresário seria utilizada para quitar os débitos que os imóveis acumulavam, como alienações fiduciárias, hipotecas e ações judiciais.

Como garantia, Thiago se comprometeu a quitar, em até 60 dias, uma dívida de aproximadamente R$ 9 milhões junto ao Sicoob e, caso não cumprisse, deveria entregar outro imóvel rural em compensação. O contrato de compra e venda foi firmado com Thiago e sua esposa Nayanna Marcelino Vieira Fagundes. No dia 23 de junho de 2023, o empresário transferiu R$ 6,9 milhões para Thiago, acreditando que o valor seria usado para amortizar a dívida com a cooperativa. No entanto, Thiago renegociou o débito com o próprio Sicoob.

Renegociação no Sicoob

Thiago da Matta Fagundes decidiu renegociar sua dívida milionária com o Sicoob em vez de quitá-la com o dinheiro recebido do empresário. No dia 30 de junho de 2023, foi firmada a Cédula de Crédito Bancário (CCB) nº 926994, um título que representa uma promessa de pagamento, no valor de R$ 14,06 milhões. A operação além de renegociar uma dívida anterior de R$ 8,09 milhões, ainda liberava novo crédito de R$ 5,83 milhões, segundo o documento.

Para isso, Thiago ofereceu como garantia os mesmos imóveis já vendidos ao empresário. Na documentação falsa entregue ao banco, constava que os bens estavam livres de ônus. Do total liberado na operação, R$ 4,3 milhões foram transferidos diretamente ao sogro de Thiago, enquanto outros R$ 1,49 milhão ficaram retidos pelo Sicoob e foram usados para amortizar parte do saldo devedor. Em 26 de outubro de 2023, a esposa de Thiago, Nayanna Marcelino Vieira Fagundes, firmou uma nova CCB, de nº 983851, no valor de R$ 16,56 milhões. Novamente, a garantia apresentada foram os mesmos imóveis da Fazenda Cana Brava. Assim, os bens já vendidos foram usados duas vezes em renegociações diferentes com a cooperativa.

O papel da diretora do Sicoob

Segundo o documento, a investigação mostrou que a diretora operacional do Sicoob, Angélica Araújo Diniz, admitiu em depoimento que o banco tinha ciência da venda da fazenda e que existia um acordo inicial para que o valor de R$ 6,9 milhões pago pelo comprador fosse usado para amortizar a dívida de Thiago. Após o depósito, Thiago desautorizou a quitação, pedindo a renegociação. Diante disso, o Sicoob formalizou a primeira CCB ciente do problema, aponta o inquérito.

Em mensagens de WhatsApp anexadas ao inquérito, a diretora chegou a confirmar que a reestruturação da dívida havia sido feita por “insistência do próprio Thiago”, e que ele deveria aguardar o fluxo interno da instituição para acesso aos valores. Portanto, o Sicoob sabia da transação entre Thiago e o empresário e, mesmo assim, autorizou a renegociação, ampliando a dívida e mantendo a fazenda como garantia.

A diretora “manteve interlocução direta com o devedor, orientando a liberação de valores em janelas específicas “após as 18h” para evitar constrições, monitorando consultas ao BacenJud e condicionando retenções internas, tudo enquanto afirmava não intervir na negociação. Além disso, promoveu e reconheceu lançamentos internos descritos como “bloqueio judicial” e “liberação judicial” sem ordem judicial vigente, expediente usado para contornar eventuais bloqueios e dar curso às repactuações e transferências subsequentes, inclusive a liberação de montante milionário a terceiros logo após a emissão de CCB”, afirma o documento.

Enquanto ela foi indiciada pelos crimes de estelionato e fraude processual, o inquérito aponta que não há provas suficientes contra funcionários e outros diretores do Sicoob, por isso, somente Angélica responde pelo caso.

Escritura e quebra contratual

Apesar das irregularidades, em 14 de agosto de 2023 foi lavrada a escritura pública de compra e venda, transferindo a posse dos imóveis para o empresário. Porém, como as restrições não foram baixadas, ele não conseguiu registrar a propriedade em cartório. No dia 17 de agosto, venceu o prazo contratual para quitação da dívida. Sem pagamento, ele  notificou judicialmente Thiago e Nayanna, exigindo a entrega de outro imóvel como compensação.

Defesa e contradições

Intimado a depor, Thiago inicialmente não compareceu. Quando foi interrogado, em 22 de janeiro de 2024, alegou ter agido de boa-fé e culpou o Sicoob por não substituir as garantias.  A defesa apresentou documentos e ingressou com ação judicial contra a cooperativa, acusando-a de impor juros abusivos (28% ao ano) e de não permitir a substituição dos imóveis dados em garantia. A defesa também acusou o banco de “fraude à execução”, ao supostamente simular bloqueios judiciais de valores recebidos por Thiago.

Outros envolvidos

Além da esposa de Thiago, Nayanna Marcelino Vieira Fagundes, que emitiu uma segunda CCB, e o sogro dele que recebeu diretamente os R$ 4,3 milhões transferidos do crédito liberado pelo SICOOB, outras pessoas participaram dos crimes. Além dos já mencionados, o núcleo central é formado pelos pais de Thiago, e outros cinco sócios e parceiros usados para movimentar recursos. O inquérito ainda levantou outros processos e execuções contra Thiago e Nayanna, envolvendo cheques sem fundos, compra de gado não paga, ações de bancos e dívidas que somam milhões de reais.

Jornal Opção

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