Em meio à crescente pressão do Congresso contra ações judiciais que atingem parlamentares, a Polícia Federal pediu ao STF (Supremo Tribunal Federal) para realizar busca e apreensão no gabinete do deputado federal Gilberto Nascimento (PSD-SP) mesmo afirmando não ver indício contra ele.
De acordo com a petição, a operação seria em benefício do próprio parlamentar, para que não houvesse “qualquer resquício de dúvida da ausência de sua participação na empreitada criminosa”.
O pedido, feito no inquérito que apura a existência de uma “Abin paralela” na gestão de Jair Bolsonaro (PL), teve parecer contrário da PGR (Procuradoria-Geral da República) e foi negado por Alexandre de Moraes.
Tanto no Senado como na Câmara há movimentações relevantes no sentido de dificultar ações do STF que atinjam parlamentares. Na Câmara, avalia-se votar texto que proíbe operações de busca e apreensão no Congresso. O Senado aprovou no ano passado PEC que restringe decisões individuais de ministros do STF.
O nome de Nascimento surge no contexto de um documento apreendido pela Polícia Federal na sede da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) em outubro.
Intitulado “Prévia Nini.docx”, o arquivo reúne uma série de apontamentos familiares, profissionais e políticos sobre a advogada Nicole Giamberardino Fabre e o Instituto Anjos da Liberdade.
Ele integra uma investigação aberta em agosto de 2019 pela Abin e que tinha como justificativa apurar suposto uso da advogada e da ONG pelas facções criminosas PCC e Comando Vermelho para derrubar uma portaria que havia endurecido as regras de visitas nas penitenciárias.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, o documento “Prévia Nini.docx” traz dois parágrafos especulativos que foram usados pela PF para dizer que a “Abin paralela” de Bolsonaro tentou vincular Moraes e o também ministro do STF Gilmar Mendes à facção criminosa PCC.
Em linhas gerais, é dito sem nenhum embasamento que Moraes teve vínculos com líderes do PCC e que Gilmar seria ligado a escritório que teria como integrante um primo da advogada Nicole.
Segundo a PF, os metadados do arquivo mostram que ele foi produzido na Câmara dos Deputados, em computador vinculado a Gilberto Nascimento. Não há informações sobre como e por que uma informação como essa foi produzida fora da agência.
No relatório feito a Moraes, assinado pelo delegado Daniel Carvalho Brasil Nascimento, a PF informa que outro documento similar ao “Prévia Nini.docx” aponta como autor Ricardo Minussi, que a PF afirma ser o assessor parlamentar Ricardo Wrigth Minussi Macedo.
O relatório registra que em outubro de 2019, mês da confecção do documento, o gabinete de Nascimento fez um pagamento de R$ 7.000 a uma empresa de Minussi a título de consultoria.
Apesar disso, a PF diz que a confecção do documento não pode ser atribuída ao “excelentíssimo deputado federal, posto que outro documento (…) vinculado a Ricardo Minussi apresenta mais informações que o primeiro arquivo”.
A PF sustenta então o pedido de busca e apreensão no gabinete de Nascimento que em várias partes do relatório é tratado erroneamente como Gilberto “Carvalho” afirmando que, embora os elementos de prova apontem que o documento foi feito à revelia do parlamentar, a operação deveria ocorrer para que isso ficasse cabalmente comprovado.
Gilberto Nascimento integra a bancada evangélica e, em 2022, atuou para que seu então partido, o PSC, apoiasse a reeleição de Bolsonaro.
Em sua decisão, Moraes autoriza as buscas nos endereços de Minussi, salvo no gabinete de Nascimento, reproduzindo as razões apontadas pela PGR, segundo quem não havia “elementos suficientes que exprimam fundadas razões sobre a necessidade, a adequação e a proporcionalidade de buscas e apreensões no gabinete do deputado federal (…), que não aparece nos autos como investigado”.
Em nota, o Gilberto Nascimento disse que “não tem controle ou conhecimento das atividades realizadas pelo prestador de serviços Ricardo Luiz Wright Minussi Macedo além do âmbito da consultoria legislativa prestada à época” e que embora não tenha conhecimento sobre o inquérito, que corre sob sigilo, “mantém confiança no sistema judiciário para uma investigação completa dos fatos”.
A PF disse que não fala sobre investigações em andamento.
O relatório da PF apresentado a Moraes (e que embasou a segunda operação no caso da “Abin Paralela”, em janeiro) não faz nenhuma menção ao então deputado federal Alan Rick, hoje senador pelo União Brasil do Acre.
Em 2019, época da produção do “Previa Nini.docx”, Minussi figurava nos boletins administrativos da Câmara como pessoa autorizada por Rick para acessar determinados sistemas da Casa. Em 2021, ele passou a ser assessor de gabinete do então deputado.
Em 2023, seguiu com Alan Rick para o Senado. O portal de Transparência da Instituição mostra que Miinussi recebeu salário de R$ 14.274 em fevereiro.
Também em nota, o senador disse que não foi alvo de qualquer operação e que não tem conhecimento do documento ou de qualquer outro serviço prestado por assessores em relações profissionais fora do gabinete.
“[Alan Rick] Reafirma que não compactua com qualquer tipo de ilegalidade e que sua conduta perante a situação será pautada em fatos concretos, assim que estes forem plenamente esclarecidos”, segue a nota, acrescentando que ele confia na apuração isenta da Justiça.
A reportagem não conseguiu falar com Minussi.
Folha de São Paulo