Categoria: Política

  • Caiado já admite tarifaço e lança linha de crédito para empresas afetadas

    Caiado já admite tarifaço e lança linha de crédito para empresas afetadas

    O governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União), já admite que o Brasil deve ser atingido mesmo pelo tarifaço em 50% pelos Estados Unidos a partir de 1º de agosto e lançou uma linha de crédito, com juros inferiores aos oferecidos pelo mercado, voltada a ajudar as empresas do estado a enfrentarem a taxação.

    A taxa de financiamento será inferior a 10% ao ano — o que, de acordo o governo estadual, é ao menos três pontos percentuais abaixo das linhas subsidiadas por programas federais, inclusive oferecidas por Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Plano Safra e fundos constitucionais.Caiado determina criação de linha de crédito pra resguardar economia goiana da guerra tarifária - Agência Cora Coralina de Notícias

    Segundo o Palácio das Esmeraldas, as condições de crédito foram estruturadas a partir de um fundo de fomento baseado em créditos de ICMS (imposto estadual). Na prática, ao utilizar créditos como garantia de empréstimos, é possível oferecer taxas de juros mais baixas sem necessidade de subsídio.

    A contrapartida exigida por Caiado das empresas é a manutenção dos empregos durante o período de acesso ao crédito. Além disso, está prevista a criação de um fundo de garantia voltado a pequenos e médios empresários, com o objetivo de alavancar a oferta de crédito por parte da iniciativa privada.

    Em 2024, os EUA foram o segundo principal destino de exportações do estado, representando US$ 408 milhões. De acordo com o governo estadual, entre os segmentos que seriam mais atingidos pelas tarifas estão as commodities, como soja, carne e derivados do aço.

    Caiado publicou um vídeo nas redes sociais sobre o tema. Na postagem, afirmou ainda que o estado estabelecerá um grupo de trabalho com representantes do governo e da iniciativa privada para avaliação de medidas adicionais.

    CNN

  • ‘Vai piorar antes de melhorar’, diz pesquisador americano sobre crise entre Brasil e EUA

    ‘Vai piorar antes de melhorar’, diz pesquisador americano sobre crise entre Brasil e EUA

    “Eu não vejo condições para um cessar-fogo agora. Na verdade, acho que vai piorar antes de melhorar.”

    Essa é a avaliação do brasilianista Brian Winter sobre a crise diplomática envolvendo o Brasil e os Estados Unidos depois que o governo americano anunciou tarifas de 50% sobre produtos brasileiros e revogou vistos de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do procurador-geral da República, Paulo Gonet.

    Segundo o governo dos Estados Unidos, as medidas foram impostas, em parte, como resposta ao suposto tratamento indevido dado pelo Judiciário brasileiro ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que é réu num processo criminal por tentativa de golpe de Estado. Bolsonaro nega seu envolvimento no caso.

    Na sexta-feira (18/07), Bolsonaro foi alvo de uma operação da Polícia Federal e passou a ser obrigado a usar uma tornozeleira eletrônica. Enquanto isso, o presidente Donald Trump classificou o tratamento dado a Bolsonaro como uma “caça às bruxas”.

    Winter viveu durante 10 anos na América Latina em países como o Brasil, Argentina e México. Ele é editor-chefe da revista Americas Quarterly, vinculada ao centro de pesquisa e debate Conselho das Américas, sediado nos Estados Unidos.

    Em entrevista à BBC News Brasil, Winter afirma que não há sinais de que Donald Trump possa recuar das medidas adotadas até agora e ele diz esperar que, nos próximos dias, mais sanções contra o país ou autoridades sejam anunciadas.

    Para Winter, dois motivos ajudam a explicar a suposta persistência de Trump em atingir o Brasil. O primeiro seria o baixo custo de um embate com o Brasil.

    “Minha impressão é que esta Casa Branca vê o Brasil como um alvo perfeito de baixo custo. Eles veem pouco ou nenhum prejuízo para o presidente Trump nesse confronto”, diz o brasilianista.

    O segundo motivo é que, na avaliação de Winter, Trump levou o caso brasileiro para o lado pessoal. Para o analista, Trump enxerga o caso de Bolsonaro como um espelho da sua própria situação nos Estados Unidos.

    Assim como Bolsonaro, Trump chegou a ser investigado por seu suposto papel na invasão do Capitólio, em 6 de janeiro de 2021, quando milhares de apoiadores de Trump invadiram prédios públicos em Washington em um evento comparado ao 8 de janeiro de 2023, no Brasil.

    “O presidente Trump realmente parece ver essa luta em termos pessoais. Ele acredita que há paralelos quase perfeitos entre o que ele viu como uma perseguição criminal contra ele e o caso que o presidente Bolsonaro está enfrentando.”

    Winter alerta que o confronto entre os dois países pode se intensificar caso Bolsonaro seja preso.

    “Se isso acontecer, acho que o presidente Trump usará todas as ferramentas à sua disposição.”

    Sobre as críticas de Trump ao sistema político brasileiro, Winter reconhece que há pontos a serem discutidos, mas rejeita a tese de que o Brasil vive um regime autoritário.

    “Não, eu não descreveria o Brasil como um regime autoritário. Eu o descreveria como uma democracia onde a liberdade de expressão foi restringida nos últimos anos de formas que, como americano, me causam desconforto.”

    Para o analista, o cenário atual seria agravado pela suposta ausência de diálogo entre os governos Lula e Trump. “O Brasil tem uma embaixadora muito competente em Washington, mas, nos níveis mais altos, entendo que não houve muita comunicação entre os dois governos.”

    Aparentando certo pessimismo, Winter diz não vislumbrar possibilidades de normalização das relações entre os dois países no curto prazo. Se nos Estados Unidos Donald Trump não veria motivos para recuar, no Brasil, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a oposição liderada por Bolsonaro parecem, na avaliação de Winter, engajadas em manter o conflito em altas temperaturas.

    “De todos os lados eu ouço um certo entusiasmo por uma escalada do conflito. Ou, pelo menos, uma resignação de que ela é inevitável”.

    Confira os principais trechos da entrevista abaixo:

    Brian Winter
    Renato Parada/Arquivo pessoal-Brian Winter é editor da revista Americas Quarterly, dedicada ao continente americano e viveu 10 anos entre Brasil, Argentina e México

    BBC News Brasil – O Brasil corre o risco de ter seus produtos tarifados em 50% pelos Estados Unidos, ministros do STF estão sob sanção e o presidente dos EUA não descarta novas medidas. O Brasil está sob ataque?

    Brian Winter – Eu não vejo condições para um cessar-fogo agora. Na verdade, acho que vai piorar antes de melhorar. Devemos ver mais sanções vindas do governo Trump nesta semana e temos uma crise clara no horizonte de médio prazo, que é a possibilidade de Jair Bolsonaro ser preso ou colocado em prisão domiciliar.

    Estive em Brasília em junho e a expectativa quase unânime era de que isso aconteceria antes do final do ano, talvez já em agosto. O presidente Trump às vezes age quase como um pêndulo. E o pêndulo agora está balançando de volta para as tarifas, não apenas para o Brasil, mas para países do mundo todo. Ele está em modo de combate.

    E minha impressão é que esta Casa Branca vê o Brasil como um alvo perfeito de baixo custo. Eles veem pouco ou nenhum prejuízo para o presidente Trump nesse confronto.

    Por outro lado, parece que a família Bolsonaro vê esse confronto como um caminho para a liberdade e talvez até para retomar o poder nas eleições de 2026, mesmo que o país acabe prejudicado no curto e médio prazo. E acho que o presidente Lula claramente também vê possíveis ganhos com esse confronto. De todos os lados eu ouço um certo entusiasmo por uma escalada do conflito. Ou, pelo menos, uma resignação de que ela é inevitável.

    BBC News Brasil – Você acredita que Trump tomará mais medidas contra o Brasil se Bolsonaro for preso?

    Winter – Sem dúvida. Se isso acontecer, acho que o presidente Trump usará todas as ferramentas à sua disposição. E, para listar quais podem ser essas ferramentas, é importante lembrar as ameaças que ele fez contra a Colômbia e seu presidente, Gustavo Petro, em janeiro, quando Petro se recusou a receber voos de deportação dos Estados Unidos […] As ameaças de Trump incluíam não apenas tarifas, mas o fim do processamento de vistos para colombianos e também sanções do Tesouro e do OFAC (sigla em inglês para Agência de Controle de Ativos Estrangeiros), que provavelmente destruiriam a economia colombiana.

    Minha preocupação é que essas opções ainda estejam na mesa no caso do Brasil, porque o presidente Trump realmente parece ver essa luta em termos pessoais. Ele acredita que há paralelos quase perfeitos entre o que ele viu como uma perseguição criminal contra ele e o caso que o [ex] presidente Bolsonaro está enfrentando. E por isso, não sei se há limites para o que Trump e seus assessores estão dispostos a fazer para garantir não apenas a liberdade, mas também os direitos políticos da família Bolsonaro.

    BBC News Brasil – Você mencionou que o Brasil seria, para o governo Trump, um inimigo de baixo custo. Mas o que Trump tem a ganhar sobre o Brasil?

    Winter – Vejo alguma divergência entre os objetivos do presidente Trump e suas táticas. Seu objetivo é claramente fazer com que as acusações criminais contra Bolsonaro sejam retiradas, usando o poder econômico dos Estados Unidos.

    Tenho sérias dúvidas se sanções, tarifas e outras medidas alcançarão isso. Na verdade, pode piorar a situação, pois até agora isso mobilizou não apenas Lula e seus apoiadores, mas também figuras muito poderosas na política brasileira, como os presidentes das duas Casas do Congresso (Hugo Motta, na Câmara dos Deputados e Davi Alcolumbre, no Senado) a se manifestarem em defesa, senão do governo, mas pelo menos em torno da ideia de soberania nacional e de que o sistema judiciário brasileiro não deve ser submetido a pressões externas.

    Essas táticas correm o risco de prejudicar ainda mais a família Bolsonaro, mas não tenho certeza de que a Casa Branca veja dessa forma.

    BBC News Brasil – Trump e seus aliados afirmam que o Brasil vive hoje sob um regime autoritário marcado pela censura. Quão precisa é essa descrição, na sua opinião?

    Winter – Mesmo em tempos bons, é difícil para os americanos entenderem o Brasil. O país não é como outros países da América Latina, já que o Brasil faz parte de forma muito menos intensa da órbita dos Estados Unidos.

    Por um lado, acho que as instituições brasileiras foram testadas nos últimos 10 anos e, às vezes, funcionaram bem. Mas também é difícil argumentar que o STF e seus integrantes sempre atuaram de forma perfeita e apolítica.

    Acho que há questões reais sobre algumas decisões tomadas por Alexandre de Moraes. E não falo apenas de críticas da direita global. Pessoas razoáveis, preocupadas com excessos, também levantaram dúvidas sobre algumas decisões dos últimos anos.

    Isso também faz parte de um debate global sobre liberdade de expressão no ambiente digital, nas redes sociais e em outros espaços e sobre o que deve ser permitido.

    Não é só o Brasil que toma decisões assim. A Alemanha e a Inglaterra também o fazem. Dizem que o Brasil não é para principiantes e este é um exemplo claro disso.

    BBC News Brasil – Mas você descreveria o Brasil como um regime autoritário?

    Winter – Não, eu não descreveria o Brasil como um regime autoritário. Eu o descreveria como uma democracia onde a liberdade de expressão foi restringida nos últimos anos de formas que, como americano, me causam desconforto.

    Cada um tem sua opinião sobre isso. Sou um americano que começou a carreira como jornalista. Preferiria ver os governos restringirem o discurso o mínimo possível.

    Mas também reconheço que o sistema e a história do Brasil são diferentes, com sensibilidades específicas por conta do passado recente de ditadura e do risco de retorno a esse modelo.

    BBC News Brasil – Você disse que não é apenas o Brasil que tem tomado medidas relacionadas à regulação das redes sociais e da liberdade de expressão. Considerando o que aconteceu com o Brasil, você acredita que ele foi afetado de forma desproporcional pela retórica e pelas ações de Trump em comparação a outros países?

    Winter – Sem dúvida. Atualmente, Trump tem uma política mais dura contra o Brasil do que contra a Venezuela ou a Nicarágua. Se você olhar para as sanções e tarifas prestes a serem implementadas, como explicar isso?

    A explicação é: porque é pessoal. Essa é uma briga que Trump e seus aliados estão ansiosos para travar. Politicamente, é uma narrativa que é, ao menos superficialmente, fácil de entender: “Bolsonaro está sendo perseguido da mesma forma que eu fui”.

    Também é importante notar que, em seus confrontos com outros países da América Latina até agora, Trump geralmente venceu: com a Colômbia sobre deportações; com o México sobre segurança nas fronteiras, e com o Panamá sobre a presença chinesa perto do canal.

    As ameaças de Trump foram seguidas por delegações governamentais voando para Washington com urgência para negociar. E isso, até onde sei, não aconteceu com o Brasil.

    BBC News Brasil – Qual tem sido o papel de Eduardo Bolsonaro na formação desse cenário e na construção dessa ideia de que se trata de uma questão pessoal?

    Winter – Acho que Eduardo Bolsonaro tem feito um trabalho muito eficaz, com ajuda de outros brasileiros que vivem nos Estados Unidos, na promoção de uma certa narrativa em Washington.

    Ele conseguiu acesso aos centros de poder nos Estados Unidos, tanto na Casa Branca quanto no Departamento de Estado e no Congresso. Ele é um comunicador eficaz. Mas também não acho que devamos superestimar o papel dele.

    Há outros integrantes do universo Trump que tiveram experiências negativas com o Brasil, especialmente com o ministro Alexandre de Moraes.

    BBC News Brasil – Você escreveu no início do ano que o principal fator de desestabilização na América Latina estaria em Mar-a-Lago, condomínio onde Trump vive na Flórida. Até que ponto, se é que em algum, o governo do presidente Lula contribuiu para o cenário atual?

    Winter – Em certos aspectos, é difícil (dizer isso), porque eu entendo que, em um país como o Brasil, o presidente Lula não pode, com um telefonema, encerrar acusações criminais contra o presidente Bolsonaro, sua família e seus aliados. O sistema brasileiro não funciona assim […]

    Dito isso, eu me pergunto se não deveria ter havido mais questionamentos sobre algumas das decisões tomadas por membros do STF nos últimos anos.

    Foram decisões que testaram os limites do que é legal. Vi muitas dúvidas sobre decisões específicas, como por exemplo, a que restringiu o uso das redes sociais por Bolsonaro ou sua comunicação com o filho (Eduardo Bolsonaro, por estar sob investigação), após a decisão da sexta-feira passada (18/07). São decisões difíceis de entender nos Estados Unidos.

    Há também um desafio adicional, que é a falta de contato entre o governo Lula e o governo Trump. O Brasil tem uma embaixadora muito competente em Washington, mas, nos níveis mais altos, entendo que não houve muita comunicação entre os dois governos. E se, como eu, o governo acreditava que um confronto era inevitável, talvez fosse o caso tentar cultivar esses contatos. Mas isso já passou.

    Agora, a conversa precisa se voltar a formas de conter os danos e, eventualmente, encontrar uma saída para esse confronto.

    BBC News Brasil – Você vê caminhos para a normalização das relações entre Brasil e Estados Unidos, considerando essa falta de canais de comunicação que você acaba de descrever?

    Winter – Não acho que o clima atual seja de pacificação. Recentemente, assisti a um filme chamado 13 Dias que abalaram o mundo, sobre a crise dos mísseis em Cuba, e naquele caso encontraram uma saída para o confronto. Mas dependia de ambos os lados quererem evitar a guerra. E acho que, agora, todos os lados no Brasil, pelo menos por enquanto, parecem querer continuar escalando o conflito. Não acho que o presidente Trump esteja interessado em desescalar agora.

    Talvez Trump pudesse dizer que as sanções estão suspensas, mas só um pedido da família Bolsonaro, e acho que especificamente do ex-presidente Jair Bolsonaro, poderia convencer, teoricamente, Trump a fazer isso.

    Mas parece que a família Bolsonaro não quer fazer isso neste momento, porque ainda têm esperanças de que esse confronto traga o que eles querem: liberdade e talvez o retorno ao poder em 2026 […]

    O presidente Trump costuma conseguir o que quer. Ele é persistente e usará todas as ferramentas disponíveis para atingir seus objetivos.

    No curto prazo, o foco precisa ser conter os danos. Empresas do setor privado nos dois países estão atuando nos bastidores para, ao menos, limitar o número de ferramentas que serão usadas. Veremos se isso será eficaz.

    BBC News Brasil – Trump vinculou as tarifas ao julgamento de Bolsonaro no STF e à forma como a Corte lida com as redes sociais. O governo brasileiro tem algo com o que negociar neste momento?

    Winter – Acho que é importante conversar, não importa o que aconteça nessas situações, e já vimos outros países fazerem isso.

    Eu apontaria para o governo de Claudia Sheinbaum, no México, como um exemplo de governo que acertou o tom e o conteúdo das negociações com a administração Trump e, por sinal, em situações em que os riscos eram maiores do que os enfrentados atualmente pelo Brasil.

    O México estava prestes a perder o acesso a um mercado para o qual envia 80% de suas exportações, sendo um país muito mais dependente do comércio do que o Brasil.

    Sheinbaum conseguiu evitar uma linguagem confrontacional com Trump. Ela conseguiu adaptar parte da retórica de Trump a um contexto mexicano de maneira que soava sincera.

    Acho que, dentro desse modelo, existe um caminho para que o Brasil possa iniciar conversas, considerando que os dois países têm grandes mercados, uma longa história de cooperação e estão em busca de melhores condições para suas classes trabalhadoras. Mas também não quero parecer ingênuo.

    Está claro, como já disse, que o principal ponto aqui para Trump é o julgamento de Bolsonaro. E é verdade: essa é uma área sobre a qual, no momento, não vejo nada que o governo Lula possa discutir, porque o Brasil simplesmente não funciona dessa forma.

    Jair Bolsonaro falando e com o dedo indicador em riste
    Getty Images – Bolsonaro foi alvo de operação da Polícia Federal na semana passada e passou a ser obrigado a usar uma tornozeleira eletrônica

    BBC News Brasil – Você mencionou que, neste momento, no Brasil, todos os lados parecem interessados em escalar o conflito. Quando você diz “todos os lados”, está incluindo o governo brasileiro, o presidente Lula. Qual o interesse do presidente Lula em aumentar a tensão com os Estados Unidos?

    Winter – Não quero exagerar esse ponto. Acho que teria sido melhor para Lula se nada disso tivesse acontecido. Não acho que tenha sido uma briga que o presidente Lula buscou ativamente, como os outros lados dessa disputa fizeram. Mas agora que ela está posta, o governo parece ver algumas vantagens políticas.

    Trata-se de um governo que viu sua popularidade cair no último ano, que enfrenta uma economia incerta e que pode ter enxergado paralelos com o que ocorreu no Canadá, por exemplo, onde Trump interveio buscando um resultado, mas acabou provocando exatamente o contrário. O partido de esquerda canadense conseguiu vencer uma eleição que estava fadado a perder antes da interferência de Trump.

    Não sei se o caso brasileiro se desenrolará como o canadense. Se a eleição fosse em outubro de 2025, acho que isso seria mais provável. Mas a eleição é só em outubro de 2026.

    Se essa briga continuar escalando ou caso se mantenha neste nível, isso será doloroso para a economia brasileira. Eu não duvidaria da capacidade da máquina de redes sociais da direita brasileira de colocar a culpa em Lula e em seus supostos aliados no STF.

    BBC News Brasil – Você mencionou que a resposta de Lula foi bastante diferente da dada, por exemplo, por Claudia Sheinbaum. Há analistas aqui no Brasil que dizem que, especialmente durante a Cúpula dos Brics, o presidente Lula teria provocado Trump. Como você descreveria o comportamento de Lula em relação a Trump? Ele cometeu algum erro, na sua visão? Poderia ter agido de maneira diferente?

    Winter – Acho que o Brasil deve tomar suas próprias decisões soberanas sobre quais alianças quer no mundo e como quer conduzir o comércio. Mas essas decisões terão consequências.

    Trump foi muito claro sobre sua posição em relação à busca por alternativas ao dólar. E isso, talvez, não seja a causa raiz do confronto, mas parece ter sido o gatilho.

    A Cúpula dos Brics e algumas das declarações feitas por Lula recolocaram o Brasil no radar dele. Se essas iniciativas e essa reunião foram do interesse nacional brasileiro, acho que é uma pergunta para os brasileiros.

    Posso dizer que países por toda a América Latina e, na verdade, em todo o mundo, estão tentando responder a essa mesma pergunta agora: como calibrar seu alinhamento entre Pequim e Washington? Ainda é possível trabalhar com os dois? Fazer comércio com os dois? Atrair investimentos de ambos? E não são apenas países da esquerda ideológica que enfrentam essa questão. Esta dúvida está presente também entre os governos de centro e de direita. Lula e o Brasil não estão sozinhos nesse dilema.

    Mas acho que parte da linguagem e o próprio fórum dos Brics foram bastante provocativos. E essa é uma das razões pelas quais estamos enfrentando esse confronto agora.

    BBC News Brasil – Como toda essa crise afeta a relação do Brasil com a China?

    Winter – Ainda estamos nos primeiros dias, e como já disse, acredito que veremos mais escaladas. Mas a duração e a gravidade desse confronto determinarão como o Brasil vai se realinhar nesse contexto global em transformação.

    A China claramente deseja expandir sua influência no hemisfério Ocidental. Mas o país tem limitações econômicas e demográficas.

    Ainda assim, parece que um dos mercados da região que Pequim decidiu tratar como estratégico é o Brasil. Até que ponto Lula pretende aprofundar essa relação com a China nos próximos 15 meses, até a eleição, não está claro. Todo conflito traz consequências não intencionais.

    Ainda estamos no início dessa crise, mas é teoricamente possível que ela tenha uma resolução de curto prazo, pouco transformadora. Mas também é possível que façamos parte de uma história mais longa de realinhamento do Brasil e de outros aliados dos EUA dentro da economia global.

    Foto de Alexandre de Moraes usando toga
    Rosinei Coutinho/STF-O ministro Alexandre de Moraes está entre os magistrados do STF que tiveram seus vistos de viagem aos Estados Unidos revogados pelo governo norte-americano em reação ao processo criminal que tramita contra Jair Bolsonaro

    FONTE BBC

  • Perícia em pen drive apreendido em banheiro de Bolsonaro é concluída; conteúdo é irrelevante, avaliam investigadores

    Perícia em pen drive apreendido em banheiro de Bolsonaro é concluída; conteúdo é irrelevante, avaliam investigadores

    A análise pericial do pen drive apreendido em um banheiro da casa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), em Brasília, foi concluída.

    Segundo fontes a par da investigação, o conteúdo do dispositivo é irrelevante para o inquérito.

    O pen drive foi localizado durante operação da PF autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF) contra o ex-presidente no inquérito que investiga coação à Justiça brasileira por parte de Bolsonaro e do filho Eduardo Bolsonaro, deputado licenciado do PL de São Paulo.

    O dispositivo foi encaminhado para perícia no laboratório da corporação.

    Na sexta (18), ao ser perguntado, Bolsonaro disse desconhecer o pen drive.

    “Olha, uma pessoa pediu para ir ao banheiro, eu apontei o banheiro, e voltou com um pen drive na mão. Nunca abri um pen drive na minha vida. Eu não tenho nem laptop em casa para mexer com pen drive. A gente fica preocupado com isso”, declarou Bolsonaro.

    O conteúdo do dispositivo era considerado uma possível peça de interesse no inquérito que investiga supostos crimes contra o Estado Democrático de Direito.

    Perícia no celular de Bolsonaro não tem prazo para terminar

    A perícia no celular de Bolsonaro, por outro lado, ainda está sendo feita e não tem data para terminar. Segundo investigadores, a extração das informações em nuvem leva mais tempo. A análise busca identificar material que tenha relação com a investigação.

    PF apreendeu US$ 14 mil e cópia de ação movida nos EUA contra Moraes

    Além do pen drive e do celular, também foram apreendidos US$ 14 mil em espécie, R$ 8 mil e uma cópia impressa de uma ação protocolada nos Estados Unidos pela plataforma de vídeos Rumble contra Moraes, alegando censura judicial.

    O documento tem apoio do Trump Media & Technology Group, empresa ligada ao ex-presidente norte-americano Donald Trump.

    fonte G1

  • Haddad: Brasil não vai sair da mesa de negociação com os EUA; governo prepara ajuda a setores afetados

    Haddad: Brasil não vai sair da mesa de negociação com os EUA; governo prepara ajuda a setores afetados

    O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou nesta segunda-feira (21) que o governo brasileiro não vai deixar a mesa negociação com os Estados Unidos sobre o tarifaço anunciado pelo presidente do país, Donald Trump.

    Em entrevista à rádio CBN, ele também disse que a área econômica já trabalha em um plano de contingência para ajudar os setores afetados pelo eventual tarifaço — com ameaça com uma sobretaxa de 50% às importações brasileiras a partir de agosto.

    “Vamos continuar lutando para ter a melhor relação possível com o maior mercado consumidor do mundo, vamos lutar por isso. Mas não vamos deixar ao desalento os trabalhadores brasileiros, vamos tomar medidas necessárias”, declarou o ministro Haddad.

    Segundo ele, um grupo de trabalho está trabalhando em opções de ajuda aos setores afetados pelo possível aumento do imposto de importação dos EUA, mas as possibilidades ainda não foram apresentadas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
    “Em uma situação como essa, a Fazenda se prepara para todos cenários. Temos plano de contingência para qualquer decisão que venha ser tomada pelo presidente da República [Lula]”, acrescentou o ministro da Fazenda.
    Ele declarou que esse plano de contingência não necessariamente vai implicar novos gastos públicos.
    Haddad lembrou que, por exemplo, na ajuda ao Rio Grande do Sul, houve outros instrumentos além do aumento de despesas, como linhas de crédito.

    De acordo com o ministro, mais da metade das exportações atuais aos EUA podem ser direcionadas para outros países, mas “isso leva um tempo” pois há contratos assinados com as empresas norte-americanas.

    “Vamos redirecionar boa parte da produção, mas isso leva tempo. E tem coisas que não tem outros destino possível, pois foi uma demanda de lá. Temos consciência de setor a setor, e estamos trabalhando a nível de empresas. Vamos atuar para minimizar ao máximo essa situação que estamos tendo”, disse o ministro Haddad.Consequências

    Segundo o ministro Haddad, a implementação do tarifaço pelo governo dos EUA resultará em consequências não somente para as empresas brasileiras, mas também para as companhias e para os cidadãos norte-americanos.

    Ele observou que o café da manhã pode ficar mais caro nos EUA, por conta da sobretaxa de 50% ao café, suco de laranja e carnes brasileiras.

    Do mesmo modo, a indústria aeronáutica americana também pode ser prejudicada.

    “A Embraer, por exemplo, compra 45% dos componentes dos aviões dos Estados Unidos. Eles [empresas norte-americanas] precisam exportar para cá também”, declarou Haddad.

    Retaliação aos Estados Unidos

    O ministro da Fazenda voltou a dizer que o país não pretende retaliar empresas e cidadãos norte-americanos por conta do tarifaço de Donald Trump.

    “Não podemos pagar na mesma moeda uma coisa que consideramos injustas”, declarou.

    Ele admitiu, entretanto, a possibilidade de governo brasileiro acionar a lei da reciprocidade, que foi aprovado recentemente pelo Congresso Nacional.

    “Todo país do mundo vai se defender de alguma maneira do que está acontecendo. É uma possibilidade, mas reitero que a orientação do presidente da República é que nos não vamos sair da mesa de negociação porque o Brasil é um país que se dá bem com todos países do mundo”, afirmou Haddad à CBN.Fonte: G1

  • Trabalho do Congresso é desaprovado por 51%; aprovação é de 42%, diz Quaest

    Trabalho do Congresso é desaprovado por 51%; aprovação é de 42%, diz Quaest

    O trabalho que vem sendo desenvolvido pelos parlamentares do Congresso Nacional é desaprovado por 51% da população, de acordo com uma pesquisa Genial Quaest, divulgada nesta segunda-feira (21).

    Em contrapartida, 42% aprovam o desempenho e outros 7% não responderam. Foram entrevistadas 2.004 pessoas entre os dias 10 e 14 de julho. A margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos; nível de confiança é de 95%.

    O levantamento também elencou os níveis de aprovação e desaprovação de acordo com temas que dividem a sociedade.

    • Religião

    Quando se trata de religião, a pesquisa considerou duas delas: a católica e a evangélica. Neste caso, o nível de aprovação dos trabalhos do Congresso Nacional é maior entre os católicos, que representam 45%. Confira:

    Católicos

    Evangélicos
    • colaridade

      Nos diferentes níveis de escolaridade do país, o trabalho dos parlamentares é mais aprovado entre aqueles que estudaram até o ensino fundamental. O maior índice de desaprovação é daqueles que possuem o Ensino Superior completo.

      Até o Ensino Fundamental

      Ensino Médio completo

      Aprovação do Congresso Nacional

      Escolaridade – Ensino Superior completo

      Posicionamento político

      O levantamento mapeou a aprovação e desaprovação de acordo com o posicionamento político dos entrevistados. Aqui, os que se classificam como lulistas/petistas, são maioria no índice de aprovação; enquanto os bolsonaristas são os que mais desaprovam o trabalho do Congresso. Veja:

      Lulista/Petista

    • Não é Lulista/Petista, mas mais à esquerda

      Não tem posicionamento 

    • Não é Bolsonarista, mas mais à direita
    • Bolsonarista

      Além disso, a pesquisa também dividiu as respostas entre aqueles que foram às urnas no segundo turno da eleição presidencial de 2022. Neste caso, os que votaram no atual presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), representam 48% em aprovação ao Congresso Nacional e 46% em desaprovação; os que votaram no ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), são 41% em aprovação e 54% em desaprovação.

      Entre os que votaram em branco, nulo, ou não foram votar, 35% aprovam o desempenho dos parlamentares, enquanto 55% desaprovam e outros 10% não souberam responder.

      • Região

        Pelas diversas regiões do Brasil, o Congresso tem mais aprovação entre os moradores do Nordeste e maior desaprovação na região Sudeste do país, segundo o levantamento. Veja:

        Nordeste

        Sudeste

        Sul 

        Centro-Oeste/Norte

      • Fonte CNN
  • Diplomatas expulsos e bloqueio a GPS: bolsonaristas listam opções de Trump

    Diplomatas expulsos e bloqueio a GPS: bolsonaristas listam opções de Trump

    Aliados do deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL) relataram à CNN que devem ocorrer mais sanções do Governo Trump contra o Brasil na próxima semana.

    Estariam na mesa opções como aumentar as tarifas para exportações brasileiras para 100%, implementar a Lei Magnitsky contra autoridades brasileiras, adotar sanções em conjunto com a Otan e até sanções tecnológicas, como bloqueio do uso de satélites e GPS.

    Também estão avaliando expulsar os diplomatas brasileiros de Washington e representantes do Brasil na Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

    Os interlocutores de Eduardo relatam à CNN, ainda, que todas as opções estão na mesa da Casa Branca e que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, está pronto para ir até às últimas consequências.

    Afirmam também que Trump considerou a decisão do Moraes e a operação da Polícia Federal desta sexta-feira (18) uma declaração de guerra contra ele e contra os EUA.

    CNN

  • Trump não vai recuar, diz Eduardo Bolsonaro à CNN

    Trump não vai recuar, diz Eduardo Bolsonaro à CNN

    O deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) expressou forte oposição à recente decisão judicial que o impede de manter contato com seu pai, classificando a medida como “repugnante”. Durante entrevista ao CNN Arena, o deputado licenciado também abordou as tensões nas relações entre Brasil e Estados Unidos, no Governo Trump.

    Sobre a decisão judicial, Bolsonaro argumentou que a situação imposta é similar a um regime semiaberto, onde uma pessoa pode sair de casa apenas para trabalhar. Ele enfatizou que a proibição de contato entre pai e filho representa uma tentativa de humilhação.

    Relações Brasil-EUA

    O deputado federal licenciado afirmou categoricamente que Donald Trump não recuará em sua posição sobre as tarifas impostas aos produtos brasileiros. Ele criticou a atual condução da política externa brasileira, apontando ausências significativas de representantes diplomáticos em momentos cruciais.

    Durante a entrevista, Eduardo Bolsonaro relatou ter participado de uma reunião no Departamento de Estado americano com oito integrantes de alto nível, onde, segundo ele, ficou evidente o desconhecimento sobre a representação diplomática brasileira nos Estados Unidos. O deputado argumentou que esta situação reflete o que considera ser a atual insignificância do Brasil no cenário internacional.

    Eduardo Bolsonaro também criticou as tentativas de negociação com o governo norte-americano, afirmando que o Brasil não estabeleceu canais adequados de comunicação. Ele argumentou que o país está vivendo um momento crucial na diplomacia brasileira, mas não tem conseguido estabelecer um diálogo efetivo com as autoridades americanas.

    CNN

  • Visto de Moraes cancelado: contato de embaixadora brasileira foi recusado pelos EUA

    Visto de Moraes cancelado: contato de embaixadora brasileira foi recusado pelos EUA

    Desdobramentos do caso “Vistos Cancelados, incluindo o de Alexandre Moraes“. Segundo apuração do analista de Internacional da CNN Lourival Sant’Anna durante o CNN Prime Time, a embaixadora do Brasil em Washington, Maria Luiza Viotti, procurou o departamento de Estado dos Estados Unidos e o contato dela foi recusado.

    Segundo fontes, a resposta do Departamento de Estado foi “too late” (tarde demais), indicando uma insatisfação com a falta de esforços anteriores do Brasil para estabelecer canais diplomáticos desde janeiro.

    Esta versão contrasta com as declarações do Itamaraty, que afirma ter realizado diversas tentativas de diálogo, incluindo uma carta enviada em 16 de maio que nunca obteve resposta.

    Residência de Eduardo Bolsonaro nos EUA

    Em paralelo a essa situação, fontes indicam que a Casa Branca determinou a aceleração do processo para concessão de residência ao deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) nos Estados Unidos. Eduardo, que atualmente reside no Texas e frequenta Miami, conta com o apoio da Universidade Internacional da Flórida e do Centro Adam Smith, instituição financiada por Ron DeSantis.

    De acordo com Cristina Rosales, ex-assessora de Trump e Biden no Departamento de Estado, existe um planejamento de escalada nas medidas contra o Brasil. As próximas etapas podem incluir o congelamento de ativos de autoridades brasileiras nos Estados Unidos e possíveis sanções secundárias contra instituições financeiras que mantenham negócios com eles.

    A situação representa um momento delicado nas relações entre Brasil e Estados Unidos, que já enfrentam tensões devido à imposição de tarifas de 50% sobre produtos brasileiros, prevista para entrar em vigor em 1º de agosto.
    CNN
  • Governo Trump anuncia sanções contra Moraes e ‘aliados’ no STF; vistos para entrar no país serão revogados

    Governo Trump anuncia sanções contra Moraes e ‘aliados’ no STF; vistos para entrar no país serão revogados

    O secretário de Estado americano do Governo Trump, Marco Rubio, anunciou na rede social X ter ordenado a revogação do visto do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), para entrar nos Estados Unidos.

    De acordo com postagem de Rubio nesta sexta-feira (18/07), além do visto de Moraes, ele solicitou a revogação da permissão para os familiares do ministro e seus “aliados” — sem detalhar quem são esses.

    “A caça às bruxas política do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, contra Jair Bolsonaro criou um complexo de perseguição e censura tão abrangente que não só viola direitos básicos dos brasileiros, mas também se estende além das fronteiras do Brasil e atinge os americanos”, argumentou Rubio.

    Questionado pela BBC News Brasil sobre que pessoas específicas além de Moraes que serão afetadas pela sanção, inclusive os “aliados” mencionados por Rubio, o Departamento de Estado americano afirmou não ter “mais nada a compartilhar sobre esse assunto”.

    Nesta sexta, por ordem de Moraes, Bolsonaro foi submetido a uma operação da Polícia Federal (PF) e a medidas restritivas — ele deverá usar tornozeleira eletrônica e está proibido de usar redes sociais, comunicar-se com “demais réus e investigados” em inquéritos no STF (incluindo seu filho, o deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro) e sair de casa entre 19h e 6h e durante os fins de semana.

    Moraes argumentou que Jair Bolsonaro estaria atuando de forma deliberada e ilícita, junto com Eduardo, para estimular sanções estrangeiras contra agentes públicos brasileiros.

    Eduardo Bolsonaro (PL-SP) se mudou para os Estados Unidos com o intuito de pressionar o governo americano a tomar medidas contra Moraes e o STF, além de angariar apoio para a anistia dos envolvidos nos atos de 8 de janeiro de 2023.

    Procurado, o STF ainda não se manifestou sobre as medidas anunciadas por Rubio contra Moraes. A BBC News Brasil também enviou pedido de posicionamento ao Itamaraty, ainda sem resposta.

    De acordo com o Departamento de Estado dos EUA, a política de restrição de visto usada contra Moraes está de acordo com a Lei de Imigração e Nacionalidade do país — a qual autoriza o secretário de Estado a tornar inadmissível qualquer estrangeiro cuja entrada nos Estados Unidos “possa ter consequências adversas potencialmente graves para a política externa”.

    Em suas redes sociais, Eduardo Bolsonaro comemorou o anúncio feito por Rubio, agradecendo ao secretário e a Trump.

    “Eu não posso ver meu pai e agora tem autoridade brasileira que não poderá ver seus familiares nos EUA também – ou quem sabe até perderão seus vistos. Eis o CUSTO MORAES para quem sustenta o regime. De garantido só posso falar uma coisa: tem muito mais por vir!”, escreveu o deputado federal, para depois escrever outra postagem afirmando que “não haverá recuo” dos EUA.

    Desde 9 de julho, quando o presidente americano Donald Trump anunciou tarifas de 50% sobre o Brasil, o governo dos EUA tem criticado de forma mais explícita o Judiciário e o governo brasileiro.

    Na ocasião, em carta postada em sua rede social, Trump também falou em uma “caça às bruxas” contra o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro na Justiça.

    Bolsonaro é réu por crimes como tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e dano contra patrimônio da União.

    Nesta sexta, a defesa do ex-presidente afirmou ter recebido “com surpresa e indignação” a imposição de “medidas cautelares severas”, já que, segundo a nota, Bolsonaro “até o presente momento sempre cumpriu com todas as determinações do Poder Judiciário”.

    Depois da ordem de Moraes, a Primeira Turma do STF, grupo de cinco ministros que julga o caso do ex-presidente, formou maioria para ratificar as medidas contra Bolsonaro.

    Sobre as tarifas impostas pelos EUA, que podem afetar setores no Brasil como a produção de suco de laranja e a aviação, Lula tem dito que vai buscar a Organização Mundial do Comércio (OMC) e eventualmente pode aplicar a Lei de Reciprocidade.

    Em pronunciamento nesta quinta-feira (17), Lula defendeu as instituições brasileiras e disse que governo americano vem fazendo uma “chantagem inaceitável”.

    Especialistas ouvidos pela BBC News Brasil avaliaram que este é o pior momento da relação entre Brasil e EUA.

    Possibilidade de sanção já havia sido apontada por Rubio

    Bolsonaro e Mills sorrindo em sala
    REPRODUÇÃO/X – Eduardo Bolsonaro e o deputado republicano Cory Mills, da Flórida

    Apesar da crise entre EUA e Brasil ter escalado nos últimos dias, a possibilidade de sanções contra Moraes se tornou mais concreta desde, pelo menos, maio.

    No dia 21 daquele mês, Marco Rubio afirmou em uma audiência no Congresso americano que a Casa Branca estava analisando a possibilidade de aplicar sanções contra o ministro do STF com base na Lei Global Magnitsky.

    Essa lei impõe penalidades a autoridades estrangeiras como o bloqueio de bens e contas no país, além da proibição de entrada em território americano.

    “Isso está sob análise neste momento, e há uma grande possibilidade de que isso aconteça”, disse Rubio ao ser questionado pelo deputado republicano Cory Mills, da Flórida, sobre o tema.

    Mills tem contato com Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que na ocasião comemorou a declaração de Rubio.

    Moraes e as big tech americanas

    Além da situação judicial de Jair Bolsonaro, outro ponto que vem sendo criticado pelo governo Trump é a atuação de Moraes em relação às big techs (empresas de tecnologia e redes sociais) americanas.

    A carta de Trump em 9 de julho justificou as tarifas mencionando decisões do STF que puniram plataformas de mídia social dos EUA com multas e com a saída do mercado de mídia social brasileiro.

    No início do ano, a plataforma de vídeos Rumble saiu do ar no Brasil por ordem de Moraes, que argumentou que a empresa descumpriu ordens para suspender contas de investigados.

    Na sexta-feira passada (11), Moraes ordenou o bloqueio de mais uma conta no Rumble, desta vez do comentarista Rodrigo Constantino.

    A Rumble e a Trump Media, empresa do presidente americano que controla a rede Truth Social, apresentaram uma petição à Justiça americana na segunda-feira questionando a exigência brasileira.

    Ambas já estão movendo uma ação contra Moraes na Justiça americana.

    Em um contexto parecido, a rede social X, do bilionário Elon Musk, também ficou fora do ar no Brasil por ordem de Moraes, durante alguns dias no ano passado.

    Musk, que apoiou fortemente Trump em sua campanha e chegou a fazer parte do governo americano, fez na ocasião comentários públicos criticando o ministro brasileiro.

    BBC

  • ‘Com cerco a Bolsonaro e sanções contra Moraes, margem para negociação entre Brasil e EUA é mínima’

    ‘Com cerco a Bolsonaro e sanções contra Moraes, margem para negociação entre Brasil e EUA é mínima’

    Com as medidas cautelares impostas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e a resposta dos Estados Unidos na forma de sanções contra o ministro Alexandre de Moraes, tornaram-se mínimas as chances de negociações entre EUA e Brasil quanto às tarifas de 50% impostas por Donald Trump aos produtos brasileiros.

    Essa é a avaliação do cientista político Guilherme Casarões, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) e coordenador do Observatório da Extrema Direita.

    “Percebe-se que há uma intenção do governo americano de cercar ao máximo as possibilidades de negociação com o Brasil, impedindo que o governo brasileiro consiga efetivamente se livrar de alguma medida punitiva por parte dos Estados Unidos”, diz Casarões, em entrevista à BBC News Brasil.

    “Existe uma ‘tempestade perfeita’ nesse momento, de medidas que os americanos tomam por motivações ideológicas ou geopolíticas, que tornam a margem de negociação do governo brasileiro muito pequena.”

    “Essa ideia de que Bolsonaro está sendo perseguido e injustiçado encontra eco na experiência de Trump”, diz o professor da FGV.

    “Com isso, se constrói uma ideia de que Bolsonaro é quase o espelho de Trump no Brasil. Isso reforça uma ligação entre eles e pode reforçar a ideia de que existe não só uma perseguição aos políticos de extrema direita ou conservadores, quanto de que haveria uma espécie de conluio transnacional para persegui-los.”

    O especialista avalia ainda que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) acerta ao deixar de lado a postura cautelosa com relação a Trump e colocar os ataques do americano como uma ameaça à soberania nacional. E poderá colher os frutos dessa estratégia nas eleições de 2026.

    “Essa mudança de tom do presidente Lula não surpreende. Ela faz sentido nesse contexto e, se for devidamente administrada, pode, de fato, possibilitar um caminho para uma reeleição ou para eleição de um sucessor no ano que vem”, diz Casarões.

    Segundo o especialista, ainda não se sabe se as sanções a Moraes e aliados vêm substituir as ameaças anteriores, que até aqui ampliaram a popularidade do governo Lula e desgastaram o bolsonarismo, ou se serão complementares a elas.

    “O fato é que estamos diante de uma tentativa sem precedentes de interferência norte-americana no funcionamento da democracia brasileira”, diz ele.

    Confira abaixo os principais trechos da entrevista.

    BBC News Brasil – As medidas cautelares contra Bolsonaro e as novas sanções contra Moraes marcam uma nova escalada no conflito entre Brasil e EUA?

    Guilherme Casarões  Sim. Em poucos dias, Trump esgotou seus recursos de pressão bilaterais e multilaterais. Por um lado, o presidente norte-americano ameaçou tarifas de 10% aos países que aderissem à “agenda antiamericana” dos Brics e, mais recentemente, o secretário geral da Otan, Mark Rutte, sugeriu a possibilidade de sanções econômicas a países aliados da Rússia.

    Por outro lado, Trump anunciou 50% de tarifas contra o Brasil, valendo-se de argumentos essencialmente políticos, para na sequência abrir uma ampla investigação contra o Brasil por supostas práticas desleais de comércio.

    Em defesa de Jair Bolsonaro, Trump busca estrangular a economia brasileira, colocando governo e instituições políticas numa situação de enorme vulnerabilidade. O agravante a isso tudo é que, por ter motivações políticas (e não técnicas), há muito pouca margem para negociação e eventuais concessões por parte do governo Lula.

    As sanções contra Moraes, que já haviam sido sugeridas há pouco mais de um mês por Marco Rubio, representam novo caminho perseguido pela Casa Branca para atingir seus objetivos políticos, ligados aos interesses de empresas de tecnologia norte-americanas e aos desígnios ideológicos de uma extrema direita cada vez mais transnacional.

    Ainda não se sabe se as sanções a Moraes e aliados vêm substituir as ameaças anteriores, que até aqui ampliaram a popularidade do governo Lula e desgastaram o bolsonarismo, ou se serão complementares a elas.

    O fato é que estamos diante de uma tentativa sem precedentes de interferência norte-americana no funcionamento da democracia brasileira.

    BBC News Brasil – Como esses novos desdobramentos, esgotam-se as possibilidades de negociações entre os países?

    Casarões – Percebe-se que há uma intenção do governo americano de cercar ao máximo as possibilidades de negociação com o Brasil, impedindo que o governo brasileiro consiga efetivamente se livrar de alguma medida punitiva por parte dos EUA.

    Existe uma tempestade perfeita nesse momento, de medidas que os americanos tomam por motivações ideológicas ou geopolíticas, que tornam a margem de negociação do governo brasileiro muito pequena.

    Efetivamente, é claro que, agora, com o agravamento da situação do ex-presidente Bolsonaro, essa margem de negociação se reduz ainda mais.

    Assim, a perspectiva de termos efetivadas as tarifas de 50% a partir do dia 1º de agosto aumenta nesse momento, na medida em que há muito pouco tempo hábil para que o governo brasileiro consiga negociar uma solução.

    BBC News Brasil – Na sua visão, o STF errou ao aumentar a tensão no momento em que o Brasil está sob a mira do Trump?

    Casarões – O argumento do Alexandre de Moraes é muito claro: havia o risco, ou pelo menos havia indícios muito claros, de que Bolsonaro poderia fugir do país e buscar asilo nos Estados Unidos.

    Inclusive, isso não foi uma mera elucubração por parte do Alexandre de Moraes e da PGR [Procuradoria-Geral da República], mas foi dito inclusive pelo Paulo Figueiredo [ex-comentarista da Jovem Pan e foragido da Justiça por sua participação na suposta tentativa de golpe] em uma live.

    Ele mencionou a possibilidade aventada por uma autoridade do governo americano de que Bolsonaro fosse para os EUA em busca de asilo político.

    E há uma série de outros crimes que justificariam as medidas cautelares contra o Bolsonaro, que envolvem obstrução de justiça e ameaça à soberania nacional.

    Então, eu diria que, no fim das contas, essa decisão da tornozeleira foi, em certa medida, consequência de tudo que a gente vem acompanhando ao longo das duas últimas semanas.

    Ela intensifica a indisposição do governo americano, mas num contexto em que não me parece que Trump teria qualquer interesse em dar abertura a negociações com o governo brasileiro.

    Ou seja, por mais que essa medida do STF nesse momento possa agravar as tensões com os Estados Unidos, e eu não vejo como elas poderiam ser evitadas ou proteladas em função da chantagem imposta pelo governo americano.

    Alexandre de Moraes
    Getty Images – ‘Por mais que essa medida do STF nesse momento possa agravar as tensões com os Estados Unidos, e eu não vejo como elas poderiam ser evitadas’, diz Casarões

    BBC News Brasil – Esse episódio pode fortalecer ainda mais a aliança entre trumpismo e bolsonarismo?

    Casarões – Fortalece, porque existem muitas similaridades entre os dois movimentos, tanto em termos daquilo que eles defendem, como com relação às estratégias.

    Existe uma narrativa compartilhada entre trumpistas e bolsonaristas sobre ditadura do Judiciário, ameaça à liberdade de expressão, ameaça comunista e globalista.

    E também porque as figuras que sustentam esses dois movimentos [Trump e Bolsonaro] passaram por processos judiciais.

    E o Trump mesmo fala, quando ele faz a carta ao presidente Bolsonaro, que Bolsonaro está passando por algo que ele já passou.

    Então há uma semelhança entre os movimentos que está no plano da estratégia, está no plano da narrativa, mas está no plano também das experiências pessoais dos líderes.

    Então, de alguma maneira, essa ideia de que Bolsonaro está sendo perseguido e injustiçado encontra eco na experiência do Trump de ter sido supostamente perseguido e injustiçado.

    Com isso se constrói uma ideia de que o Bolsonaro é quase que o espelho do Trump no Brasil. E isso, claro, reforça uma ligação e pode reforçar essa ideia de que existe não só uma perseguição aos políticos de extrema direita, quanto há uma espécie de “conluio transnacional” para persegui-los.

    Donald Trump e Jair Bolsonaro durante um jantar em Mar-a-Lago, Palm Beach, Flórida, em março de 2020
    AFP-‘Ideia de que Bolsonaro está sendo perseguido e injustiçado encontra eco na experiência do Trump’, diz professor da FGV

    BBC News Brasil – E quão grave é a crise atual entre Brasil e EUA?

    Casarões – Eu era mais cético a respeito dessa crise até duas semanas atrás. Eu achava que era, claro, uma tensão que merecia atenção, cautela. Que era um momento difícil da relação dos dois países, mas que dificilmente iria degringolar numa briga aberta entre Lula e Trump.

    Até porque o Lula estava sendo muito cauteloso na relação com o presidente americano.

    A partir do dia 9 [de julho], em que as tarifas de 50% foram decretadas, ali se abre um capítulo que é talvez o momento de maior esgarçamento das relações bilaterais [entre Brasil e EUA].

    Porque ele não só contamina a relação de Estado e Estado e cria uma relação difícil entre empresas e setor produtivo de Brasil e EUA, mas também porque é a primeira vez que vemos um nível de estresse tão grande entre dois líderes dos países.

    Outra coisa é que temos visto agora uma altercação quase que permanente entre os dois presidentes.

    O Trump já deu várias declarações sobre o Brasil. O Lula já falou várias vezes e inclusive, numa entrevista à CNN americana, chamou o Trump de “imperador do mundo”.

    Então é um nível de hostilidade interpessoal que eu não me recordo ter havido em nenhum outro momento da história da relação do Brasil com os Estados Unidos.

    BBC News Brasil – E como a ação de Trump em relação ao Brasil se compara à ação dele contra outros países como México, Canadá e China?

    Casarões – Trump voltou atrás com várias dessas medidas tarifárias que ele tomou. Mas me parece que em todas elas – claro que sempre há um componente político –, mas havia sobretudo uma justificativa de natureza econômica.

    De depender menos da manufatura produzida no México, de exportações vindas do Canadá, e de tornar a economia americano menos dependente da China.

    Quer dizer, no caso dos outros países contra quem houve medidas tarifárias, havia um cálculo econômico, que está completamente ausente dessa medida com relação ao Brasil.

    Inclusive a carta dele do dia 9 traz um argumento errado: o de que os EUA seriam deficitários na relação comercial com o Brasil, o que não é verdade há muitas décadas.

    Então, me parece que o conjunto de investigações que o Trump abre na semana seguinte com base na seção 301 da Lei de Comércio é uma forma de corrigir uma afirmação que foi errada, e colocar o Brasil numa situação de impossibilidade de negociar efetivamente.

    Porque, com relação ao motivo político, não tem o que ser feito. O Brasil não vai simplesmente parar os seus processos judiciais contra o Bolsonaro e aliados porque o Trump falou alguma coisa.

    E, nas investigações que vieram depois, os americanos acusam o Brasil de estar prejudicando Visa e Mastercard porque tem o Pix. Mas qual é a solução para isso? Abrir mão do Pix não faz sentido.

    Então, a sensação que eu tenho é de que o conjunto de medidas a que o governo Trump está recorrendo, desde ameaças aos Brics, passando por ameaças diretas ao Brasil e essa investigação recente de comércio, não foram feitas para negociar no plano comercial.

    Ainda que o Lula tenha destacado uma delegação liderada pelo [vice-presidente Geraldo] Alckmin para fazer esse tipo de trabalho de bastidor, o objetivo do Trump é fundamentalmente político.

    Lula e Alckmin
    Getty Images -‘Ainda que Lula tenha destacado uma delegação liderado por Alckmin para fazer trabalho de bastidor, objetivo do Trump é fundamentalmente político’, diz Casarões

    BBC News Brasil – Como você avalia a atuação do Brasil com relação ao tarifaço até aqui?

    Casarões – Eu acredito que o governo brasileiro tem agido de maneira correta, dadas as circunstâncias.

    Quer dizer, se não há espaço para negociação, cabe ao governo brasileiro seguir a rota dupla que ele tem seguido.

    De um lado, tentar negociar aquilo que dá para negociar. E o Itamaraty, o MDIC [Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços] e a Fazenda têm feito um trabalho importante nesse sentido.

    Mas, ao mesmo tempo, como a motivação do Trump é política, a resposta do governo brasileiro tem que também estar no campo político.

    E aí o Lula acabou incorporando essa resposta de natureza política. E foi uma resposta arriscada, mas correta. Arriscada porque, dada a imprevisibilidade do governo americano, não sabemos qual vai ser a próxima reação.

    Mas a própria maneira como o governo brasileiro respondeu conseguiu unir setores produtivos importantes que também ficaram descontentes com as medidas americanas. E havia muito tempo que Lula não tinha um alinhamento muito claro com o agronegócio e com a indústria.

    Ao mesmo tempo, Lula conseguiu capitalizar um pedaço dessa resposta na sua retórica de soberania nacional. O que, como as pesquisas da Atlas e da Quest indicam dessa semana, acabou dando uma sobrevida para o presidente, num momento em que a popularidade dele estava em declínio.

    BBC News Brasil – E como você avalia a postura do Lula comparando ela a de outros líderes do cenário internacional? Algum outro líder soube lidar melhor com as tarifas de Trump?

    Casarões – Olha, cada caso é um caso, porque a percepção de ameaça é muito diferente de país para país.

    Lula conseguiu colocar muito bem que as medidas de Trump de fato representam uma ameaça aos interesses econômicos brasileiros. Não é só uma ameaça ao PT, uma ameaça ao Supremo, é uma ameaça ao Brasil. E essa virada de chave foi muito importante.

    As pesquisas dessa semana indicam que não só a popularidade do Lula aumentou, mas aumentou também a percepção de que Trump representa um problema para o Brasil. Então há uma visão negativa com relação aos EUA e, sobretudo, ao governo Trump, que também está se formando.

    Então é difícil comparar com outros casos.

    A [presidente do México] Claudia Sheinbaum talvez tenha sido uma referência importante, porque ela conseguiu manter o discurso nacionalista e, ao mesmo tempo, não confrontar o Trump de maneira tão direta.

    Mas a natureza da relação do México com os EUA é muito diferente da nossa. É uma relação de dependência muito maior.

    Ainda que os EUA sejam o segundo maior parceiro comercial do Brasil, isso representa, em termos concretos, uma fração menor do nosso comércio, com impactos econômicos menores também. Então Lula teve a possibilidade de aumentar o tom contra Trump, sem que isso representasse um risco monumental para a economia brasileira.

    Essa mudança de tom do presidente Lula não surpreende. Ela faz sentido nesse contexto e, se for devidamente administrada, pode, de fato, possibilitar um caminho para uma reeleição ou para eleição de um sucessor no ano que vem.

    Lula durante pronunciamento televisivo sobre as tarifas de Trump
    Divulgação/Planalto-‘Mudança de tom do presidente Lula não surpreende. E, se for devidamente administrada, pode, de fato, possibilitar um caminho para uma reeleição’, diz cientista político

    BBC News Brasil – E como é que você avalia a aprovação da Lei de Reciprocidade? Retaliar é o melhor caminho para o Brasil?

    Casarões – A Lei da Reciprocidade foi aprovada há alguns meses [no Congresso, foi aprovada em 2 de abril, e assinada por Lula em 14 de julho] e ela não tinha como mote principal medidas do governo americano.

    É uma lei que foi discutida durante muito tempo e estava muito focada em medidas protecionistas europeias. Então, não foi uma lei casuisticamente pensada para lidar com os EUA.

    E a reciprocidade é muito difícil, porque ela pressupõe relações mais ou menos simétricas entre dois países e, no caso, a relação do Brasil com os EUA não se trata de uma relação simétrica, nem economicamente, nem politicamente.

    Então, existem riscos no uso da reciprocidade no tratamento de um país que é muito mais poderoso do que o Brasil.

    Mas parece que o governo tem pensado em como redirecionar parte das exportações que eram destinadas aos EUA, de forma a tornar o Brasil, no médio prazo, menos dependente das relações econômicas com os EUA. E, a partir disso, poder retaliar de maneira mais dura medidas [dos EUA] que o governo [brasileiro] considera arbitrárias contra a nossa economia.

    Mas certamente as medidas não vão ser tomadas de supetão, de uma hora para outra. Até porque, o custo econômico disso, sem o devido planejamento, pode ser muito alto para setores importantes da economia brasileira.

    BBC News Brasil – Por fim, em abril, quando começou a discussão das tarifas, alguns especialistas diziam que elas podiam representar uma oportunidade para o Brasil, que o país poderia baixar suas próprias tarifas e se abrir para outros mercados. Mas tudo isso foi antes da tarifa de 50%. Você avalia que ainda há oportunidades a serem aproveitadas pelo país no contexto atual?

    Casarões – Eu diria que sim. Mas o próprio redirecionamento de exportações brasileiras tem um limite. Ela não consegue ser feito de maneira automática.

    Existem setores, como aço, por exemplo, que não tem como ter competitividade nos mercados asiáticos.

    Então acredito que o governo brasileiro vai tentar olhar de maneira mais específica para a América do Sul, onde me parece haver um pouco mais de receptividade a produtos brasileiros

    De maneira geral, eu diria que as oportunidades permanecem, mas que essas tarifas de 50% colocam um dado novo nessa equação.

    O Brasil, na primeira leva tarifária, lá do Dia da Libertação, foi muito pouco penalizado. Ele tinha 10% [de tarifa], era menos do que a maioria dos países naquele momento.

    Então, essa oportunidade que muitos analistas apontaram era mais simples de se efetivar, já que a relação comercial entre o Brasil e os EUA não seria tão prejudicada.

    O problema é que, agora, a incidência de tarifas pega justamente muitos setores cruciais da economia: suco de laranja, aço, aeronaves.

    Então, há oportunidades ainda, me parece. Mas é muito difícil substituir o padrão de comércio que temos com os EUA até aqui. Que não é gigantesco, mas ainda assim é significativo, com impactos setoriais muito grandes, que vão ter que ser avaliados.

    BBC