Há pouco mais de dois anos, o Brasil viveu – ou sobreviveu – à escalada de conflitos institucionais. O ‘tiroteio’ de versões, fatos – fakes até -, decisões judiciais, canetadas, judicialização colocou em lados opostos dois personagens que qualquer historiador vai ter de se debruçar para entender a segunda década do século XXI: o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e, até há pouco tempo, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Constantemente criticado pelos apoiadores do ex-presidente – os bolsonaristas -, Alexandre de Moraes garantiu, desde antes do pleito de 2020, colocar o cabresto no grupo mais radical que queria ‘colocar’ um ponto final na democracia: nem mesmo bolsonaristas negam o fato. Ocorreu enquanto o processo eleitoral ia caminhando bem, como vinha há décadas, e as urnas eletrônicas foram atacadas, deslegitimadas e tratadas com, para dizer o mínimo, ignorância. Era acusada de manipulável mesmo que diversos testes, inclusive de órgãos internacionais – sérios, por sinal – atestavam o contrário.
Moraes colocou tornozeleira eletrônica em gente poderosa que queria e tentou de várias maneiras deixar o sistema eleitoral mais frágil com o intuito, concluiu-se depois, de fortalecimento da narrativa de um golpe – ainda não se explicou bem em quais moldes. O fato é que houve minuta e tudo, reunião, gritaria, exigência e prisão de Mauro Cid, o ajudante de ordens e sabe-e-faz tudo de Bolsonaro no Planalto.
Moraes deixará o TSE em 3 de junho. E a ala política do bolsonarismo agradece ao tempo por ter passado rápido demais – ou não passou tanto assim, porque o estrago foi grande. Quem não lembra do dia 8 de janeiro. Oito dias após a posse de Lula naquele ano de 2023 ainda debilitado por causa do alvoroço que foi 2022 e o processo eleitoral. Duas idas às urnas sob a supervisão de Moraes, com uso indiscriminado da máquina para benefício de grupos.
Assume Cármen Lúcia, a ministra experiente, com mais tato com as críticas, polida e que não gosta de embates. Ela deverá usar da artimanha de conversar nos “autos”, no plenário, sem tentar colocar o holofote em si. Este ano é eleitoral. Mais de 5 mil prefeitos e prefeitas vão ser eleitos e eleitos. E milhares de vereadores. Vai ser a Cármen Lúcia que vai monitorar tudo. Ela que já ocupou a presidência do Supremo Corte e, por conseguinte, o Conselho Nacional de Justiça. É expert na constitucionalidade e, por enquanto, não tem um histórico de richa com a ala bolsonarista.
Com a mudança, o TSE ganha André Mendonça, um ministro mais alinhado com Jair Bolsonaro. Com isso, o bolsonarismo pode respirar mais tranquilo e felizmente, se é que se pode dizer isto num país tão conflagrado. De qualquer maneira, é a democracia demonstrando seu poderio. E, quem sabe, mostrando, ao mundo – que, sob a ótica contaminada do dono do X (antigo Twitter – não vive uma ditadura judicial. O que se vive é um embate ferrenho entre o judiciário constitucionalista (sic) e um grupo político mais radical, barulhento, desrespeitoso. E poderia ser a esquerda, como ocorre em diversos países, com instalação de ditaduras, como é o caso da Venezuela – ali é um caos. E é preocupado com isto, garante ele próprio, que Moraes foi para a linha de frente.
Quem não se lembra das impopulares decisões durante as prisões em massa de baderneiros do 8 de janeiro de 2023. Irritou muita gente. Mas deu o recado. Não se pode brincar de invadir prédio público, muito menos aqueles que representam o povo brasileiro e a Constituição brasileira.
O HOJE