O STF (Supremo Tribunal Federal) chegou, nesta quarta-feira (8), a um placar de 5 votos a 2 a favor de manter os dispositivos da Lei das Estatais que restringem a indicação de políticos para cargos em conselhos e diretorias de empresas públicas.
No entanto, os cinco ministros que votaram neste sentido entendem que devem ser mantidas as nomeações feitas pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e por outros gestores após o ministro Ricardo Lewandowski -que se aposentou do Supremo e hoje é ministro da Justiça- ter derrubado as restrições da lei em decisão liminar (urgente e provisória).
A decisão de Lewandowski é de março do ano passado, e pode ser derrubada com o julgamento que acontece nesta semana. Depois do sétimo voto, a sessão desta quarta foi suspensa e a análise do caso será retomada nesta quinta-feira (9).
O julgamento sobre o tema começou no ano passado e foi paralisado por um pedido de vista (mais tempo para análise) do ministro Kassio Nunes Marques.
Até o momento, cinco ministros já votaram a favor da constitucionalidade da lei, e dois se manifestaram de forma contrária aos trechos que determinam essas restrições. Dias Toffoli foi o primeiro a votar nesta quarta, a favor da legislação.
Foi ele quem propôs, porém, que sejam mantidas as nomeações feitas durante o período em que os trechos foram suspensos por decisão de Lewandowski.
Kassio, Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso também acompanharam o entendimento de Toffoli. André Mendonça, que já havia votado pela constitucionalidade anteriormente, decidiu seguir a sugestão de Dias Toffoli.
Do lado oposto, a favor da derrubada das restrições, estão Flávio Dino e o próprio Lewandowski -cujo voto permanece válido, mesmo após sua saída do STF.
Kassio e Toffoli participaram da sessão por videoconferência. Ambos estiveram em eventos jurídicos em Madri na última semana.
Em março do ano passado, Lewandowski votou de forma virtual a favor de derrubar as restrições e também deu a liminar que liberou a possibilidade.
O ministro, que hoje é chefe da pasta da Justiça, derrubou a quarentena de 36 meses imposta a dirigentes de partidos políticos e a pessoas que atuaram em campanhas eleitorais para ocuparem cargos de direção em empresas públicas e em sociedades de economia mista.
Lewandowski também determinou a derrubada da vedação à indicação de ministros de Estado, secretários estaduais e municipais para cargos de conselho de administração e diretorias.
A corte voltou a julgar o tema de forma presencial em dezembro, com o voto do ministro André Mendonça, contrário ao entendimento de Lewandowski.
Mendonça votou por manter as restrições previstas na legislação, que, para ele, resultaram em “redução significativa de situações de risco de corrupção”.
“[O risco] Não é em função das pessoas, é em função do contexto em que as pessoas estão inseridas”, disse o ministro.
“Boas pessoas em contextos inadequados estão sujeitas a situações que não estariam em outros contextos”, acrescentou. “O melhor remédio para a boa governança, ou, em outras palavras, o melhor remédio contra a corrupção, é a prevenção”.
Nesta quarta, Toffoli votou pela validade da Lei das Estatais, com a ressalva sobre as nomeações. Kassio acompanhou o ministro, mas também sugeriu a redução de quarentena de 36 para 21 meses. Alexandre de Moraes e o presidente da corte, Luís Roberto Barroso, também seguiram o entendimento de Toffoli.
“Eu teria votado para derrubar a cautelar [decisão de Lewandowski], porque acho que a lei é constitucional”, disse Barroso.
“Mas agora, passado tanto tempo, em que pessoas já estão exercendo os cargos há mais de um ano, eu acho que a gente criaria uma instabilidade indesejável, afetando o princípio da continuidade dos serviços públicos.”
Flávio Dino se manifestou pela derrubada do artigo que propõe a quarentena. No entanto, propôs que seja vedada a ministros de estados e a secretários estaduais a participação em diretorias ou em conselhos de administração dos órgãos reguladores ou supervisores das pastas que chefiam.
Ao votar, Dino afirmou que há corrupção entre pessoas de quadros técnicos ou concursados. Ele mencionou os escândalos da Petrobras da última década e disse que não ousa “dizer que foi a maioria, mas muitos, dezenas de agentes ímprobos eram servidores do quadro técnicos, não eram políticos”.
“E mais, se o concurso santificasse, imunizasse, dando caráter técnico, não político, não existiriam magistrados corruptos. E os há. Há magistrado que solta traficante, há magistrado que vende sentença. Há ou não há? O CNJ [Conselho Nacional de Justiça] sabe disso.”
Já Gilmar Mendes, o decano do Supremo, ainda não votou, mas nas sessões de julgamento fez manifestações que apontam uma tendência contrária à restrição.
“Isso vai para muito além do que seria um critério de razoabilidade. Eu me lembro, por exemplo, que o último chefe financeiro da campanha de Fernando Henrique [Cardoso] foi José Gregori. Poderia, então, ser ministro, mas não poderia ser chefe nem de um conselho de administração”, disse o decano do Supremo, no ano passado.
“Será que isto faz sentido? Será que isto não leva a um critério a um arbítrio nesse contexto?”, questionou.
Além de Gilmar, ainda votarão Edson Fachin, Luiz Fux e Cármen Lúcia.
GOVERNO DEFENDE FIM DAS RESTRIÇÕES
O fim das restrições impostas pela Lei das Estatais é de interesse do governo Lula, que tem o objetivo de abrir caminho para encaixar aliados políticos nas companhias.
Como o voto de Lewandowski continua válido, o seu sucessor na corte, ministro Cristiano Zanin, não irá votar no julgamento.
A Lei das Estatais foi aprovada pelo Congresso em 2016, em meio aos escândalos de corrupção envolvendo a Petrobras e outras empresas públicas descobertos pela Operação Lava Jato.
Integrantes do governo defendiam que essa regra tem como premissa a criminalização da política.
O questionamento ao Supremo foi protocolado em dezembro de 2022, após a vitória de Lula, pelo PC do B, aliado histórico do PT.
O partido afirmava que a “suposta finalidade” da Lei das Estatais (assegurar a eficiência da gestão dos administradores das empresas públicas) “não é atingida por meio do impedimento de indicação de pessoa que tenha vínculos político-profissionais com a administração pública ou que tenha participado de atividades partidária-eleitorais nos últimos 36 meses”.
“Isso porque tais elementos não resultam, necessariamente, em uma gestão imparcial por parte dos administradores indicados. Fosse assim, seria forçoso reconhecer a imparcialidade automática de juízes, promotores, procuradores, e militares das Forças Armadas da ativa que, antes do ingresso efetivo em seus respectivos cargos, tenham atuado em estrutura partidária ou eleitoral”, diz a ação.
O PC do B pediu que, se o Supremo não suspendesse completamente o dispositivo da Lei das Estatais, que ao menos fixe o entendimento de que é possível a indicação de políticos para postos de cúpula das empresas públicas desde que eles encerrem o vínculo partidário a partir do efetivo exercício no cargo.
Folha de São Paulo