A Polícia Federal (PF) concluiu que falhas da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal foram “fatores decisivos” que contribuíram para a “ineficiência da resposta” aos ataques de 8 de janeiro de 2023 a prédios dos Três Poderes, em Brasília. Em documento encaminhado ao Supremo Tribunal Federal (STF), o delegado responsável pela investigação, Raphael Soares Astini, aponta que “a ausência inesperada” de Anderson Torres, então secretário de Segurança, evidenciou esse cenário. “Embora houvesse várias informações críticas disponíveis sobre o risco de violência, essas informações não foram devidamente compiladas, analisadas ou retransmitidas às forças de segurança competentes”, diz o relatório.
A apuração indicou ainda a suposta omissão de agentes públicos nos ataques às sedes dos Três Poderes. Núcleos Os investigadores dividiram os responsáveis em quatro núcleos: Polícia Militar do Distrito Federal (PM-DF), Forças Armadas, Gabinete de Segurança Institucional (GSI), e Secretaria de Segurança Pública. No primeiro caso, foram usadas informações da denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) relativa ao trabalho da cúpula da PM. “Consta da denúncia que, após o resultado das eleições presidencial de 2022, os oficiais da PM-DF, incluindo os acusados, compartilharam informações falsas sobre fraudes eleitorais e discutiram estratégias ilegais para contestar o resultado das eleições”.
São listados: coronel Fábio Augusto Vieira, que à época dos fatos exercia o cargo de comandante da PMDF; coronel Klepter Rosa Gonçalves, que exerceu a função de subcomandante; coronel Jorge Eduardo Barreto Naime, que foi chefe do Departamento de Operações (DOP) durante os eventos; coronel Paulo José Ferreira de Sousa, que atuou como subchefe do Departamento; coronel Marcelo Casimiro Vasconcelos Rodrigues; major Flávio Silvestre de Alencar; e tenente Rafael Pereira Martins. “Os oficiais, todos em posições de comando na PMDF, foram denunciados por se omitirem dolosamente em suas funções, permitindo que os atos de violência e vandalismo se concretizassem”, diz o documento. “Essa omissão, conforme alegado, constituiu como contribuição direta para a materialização dos crimes e para a falha na proteção dos bens públicos”. Acampamentos No núcleo “Forças Armadas” não são listados responsáveis. No entanto, o relatório diz que as mobilizações e acampamentos após as eleições de 2022 evidenciaram a gravidade e o caráter antidemocrático das ações. “A defesa de intervenção militar e a alegação de fraude eleitoral mobilizaram manifestantes, que se estabeleceram em frente a quartéis e bloquearam rodovias estratégicas, gerando impacto social significativo”, diz o texto. “As evidências sugerem que os envolvidos tinham clara consciência das intenções subversivas e dos riscos das suas ações, mostrando uma contestação violenta ao processo eleitoral e à ordem democrática, não podendo ser justificadas sob a alegação de desconhecimento ou simples liberdade de expressão”.
“Série de falhas”
Quanto ao GSI, foi relatado que, “como parte integrante do Sistema Brasileiro de Inteligência (Sisbin), tinha a obrigação de manter suas informações atualizadas e compartilhar os dados críticos com outros órgãos, como a Abin e as forças de segurança do Distrito Federal”. São apontados por “falhas na condução das medidas de segurança”: o coronel Alexandre Santos de Amorim, então chefe da Coordenação-Geral de Análise de Risco; o coronel André Luiz Garcia Furtado, que foi coordenador de Segurança das Instalações; e os generais Carlos José Russo Assumpção Penteado e Carlos Feitosa Rodrigues, que eram secretários do GSI. “A invasão e depredação do Palácio do Planalto, ocorrida em 8 de janeiro de 2023, revela uma série de falhas estruturais e operacionais no Gabinete de Segurança Institucional.
A falta de ação dos agentes responsáveis, a má gestão das informações de inteligência e a insuficiência do Plano Escudo para conter os manifestantes foram fatores determinantes para as invasões”, conclui o relatório. “Vasta experiência” Já no núcleo Secretaria de Segurança Pública, são listados: Anderson Torres, ex-secretário; Fernando Sousa Oliveira, então secretário executivo da pasta; Marília Ferreira de Alencar, subsecretária de Inteligência; e Cíntia Queiroz de Castro, subsecretária de Operações Integradas. “Considerando a vasta experiência prévia dos envolvidos, que já haviam atuado em eventos de grande complexidade e porte, era razoável esperar que estivessem plenamente preparados para lidar com a situação que se desenrolou no dia 8”.
Segundo o relatório, dada a posição de destaque que ocupavam e o conhecimento acumulado ao longo de suas carreiras, seria natural presumir que as medidas necessárias seriam implementadas de forma “coordenada e eficiente”, de modo a prevenir ou mitigar os efeitos das manifestações violentas. Outro lado A Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal informou que não comenta sobre investigações e processos judiciais em andamento. A defesa de Torres disse que não teve acesso ao relatório final e que, “no curto trecho publicado no despacho, percebe-se grave equívoco cometido pela autoridade policial, pois não houve ‘ausência inesperada’, já que Anderson Torres tinha férias planejadas e comprou as passagens para toda família no mês de novembro de 2022, quando sequer se imaginava a realização de qualquer manifestação”.
Os defensores do ex-secretário também alegam que ele “teve o cuidado de preparar um PAI (Protocolo de Ações Integradas), antes das férias, diante das informações sobre as manifestações”. “Se o PAI tivesse sido cumprido, teria evitado os reprováveis atos do fatídico 8 de janeiro”. A CNN tenta contato com os advogados dos demais citados no relatório.
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