quinta-feira, outubro 3, 2024
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Engenharia de tecidos fetais para o tratamento de malformações congênitas, por Dario Fauza*

Anomalias congênitas maiores são detectáveis em 2% a 3% dos recém-nascidos vivos. Tais doenças são responsáveis por cerca de 20% das mortes ocorridas no período neonatal e por índices de morbidade ainda mais elevados durante a infância. Por definição, defeitos congênitos incluem perda e/ou malformação de tecidos ou órgãos. O tratamento cirúrgico dessas anomalias freqüentemente é limitado pela falta de tecidos ou órgãos normais para o reparo, seja de modo autólogo ou alólogo, principalmente ao nascimento. Enxertias autólogas geralmente não são uma opção viável em recém-nascidos, devido às dimensões reduzidas dos potenciais sítios doadores. Por sua vez, a crônica escassez na oferta de órgãos e tecidos, observada em praticamente todas as modalidades de transplantes, é ainda mais crítica no período neonatal.

Nós introduzimos a engenharia de tecidos fetais como um novo conceito em cirurgia perinatal, envolvendo a coleta, de preferência minimamente invasiva, de células fetais, que são então processadas por técnicas de engenharia de tecidos in vitro em paralelo ao restante da gestação, de tal modo que um recém-nascido portador de uma malformação congênita de interesse cirúrgico diagnosticada no período prénatal possa se beneficiar da pronta disponibilidade de tecido autólogo, confeccionado e expandido em laboratório, para implantação antes ou depois do nascimento. A engenharia de tecidos é uma ciência multidisciplinar, na qual os princípios e métodos da engenharia se unem àqueles das ciências biológicas, para o estudo das relações entre estrutura e função em tecidos e órgãos, seja em estados normais ou patológicos, assim como para o desenvolvimento de substitutos biológicos que possam restaurar, manter, ou melhorar a função de tecidos ou órgãos. Muitas das limitações da engenharia de tecidos podem ser melhor contornadas, senão completamente evitadas, pelo uso de células fetais na confecção de neo- tecidos. Comparadas às células maduras, células fetais têm maior capacidade de proliferação, grande plasticidade de diferenciação, produção abundante de fatores tróficos e angiogênicos, baixa expressão de antígenos de histocompatibilidade, tolerância a baixas tensões de oxigênio, frouxa adesão intercelular e maior resistência à criopreservação.

Além do feto em si, uma variedade de outros sítios anatômicos podem servir de fontes de células fetais em quantidades compatíveis com o processamento necessário para a engenharia de tecidos. Até agora, as seguintes fontes mostraram-se viáveis: líquido amniótico, placenta e cordão umbilical. Destas, o liquido amniótico e a placenta são as menos invasivas, principalmente porque a amniocentese e a biópsia vilo-corial são métodos rotineiros amplamente empregados de diagnostico pré-natal, o que também minimiza o surgimento de eventuais objeções éticas a seu uso como fontes de células. Isto é particularmente verdadeiro em relação ao líquido amniótico, já que uma amniocentese é tipicamente oferecida a qualquer mãe cujo feto tenha sido diagnosticado com uma malformação estrutural através de imagenologia pré-natal. Além disso, a amniocentese é a forma mais segura de todos os métodos de diagnostico pré-natal invasivo, tendo sido associada a um índice de aborto espontâneo inferior a 0,5%, em mãos experientes. Uma pequena alíquota extra de liquido amniótico, a ser usada para a engenharia de tecidos, poder ser obtida durante a amniocentese diagnóstica sem qualquer risco adicional para a mãe ou feto (figura).

Novos tecidos ou órgãos podem ser criados através de três estratégias gerais de engenharia, ou de diferentes combinações entre elas: células, ou substitutos celulares, isolados; substâncias indutoras de tecidos; ou células contidas em matrizes. Em nosso desenvolvimento experimental, este último método foi aplicado em diversos modelos animais de grande porte de anomalias congênitas, quais sejam defeitos de pele, extrofia de bexiga, defeitos da parede torácica, anomalias de vias aéreas, hérnia diafragmática e defeitos miocárdicos. Em cada um destes modelos, espécimes diferentes de neotecido fetal, incluindo pele, parede total da bexiga, condutos aéreos cartilaginosos e precursores musculares foram produzidos em laboratório de modos distintos e então implantados in vivo para o tratamento destas várias anomalias. Em todos estes modelos in vivo, os neo-tecidos fetais levaram a benefícios terapêuticos quando comparados a formas convencionais de terapia, ou a enxertos acelulares, além de mostrarem potencial de transdiferenciação.

Estes dados sugerem que a engenharia de tecidos fetais poderá vir a ser uma alternativa de escolha para o tratamento cirúrgico de determinadas malformações congênitas. Um processo de aprovação do primeiro ensaio clínico, a ocorrer em Boston, está atualmente em andamento na “Administração de Drogas e Alimentos” dos EUA.

DARIO FAUZA- MD, PhD- Attending Surgeon, Department of Surgery -Associate Professor of Surgery, Harvard Medical School

Department of Surgery

300 Longwood Avenue

Boston, Massachusetts 02115

Phone: 617-355-7800

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