Descoberta pode ser um potencial tratamento para obesidade e redução do peso sem as restrições de outros procedimentos atualmente disponíveis
Um novo tratamento para obesidade promete perda de peso sem a necessidade de fazer uma cirurgia bariátrica e sem os efeitos colaterais associados a outras drogas para emagrecimento, como enjoos e náuseas.
Além disso, a droga levou à redução de cerca de 80% do apetite em ratos testados em laboratório e diminuiu, em média, 12% do peso em 16 dias de tratamento. Com isso, a descoberta pode ser um potencial tratamento para obesidade e redução do peso sem as restrições de outros procedimentos atualmente disponíveis.
O experimento com a molécula, batizada de GEP44, foi feito em ratos obesos em laboratório e ainda precisa ser realizado e aprovado em humanos. Os resultados da pesquisa foram apresentados no encontro da Sociedade de Química Americana (ACS, na sigla em inglês).
A droga injetável mimetiza os efeitos de uma cirurgia bariátrica por atuar de forma semelhante ao GLP-1 (peptídeo do tipo glucagon 1) e o PYY (peptídeo YY). O primeiro atua reduzindo o nível de glicose no sangue ao liberar insulina na corrente sanguínea, enquanto o segundo trabalha na sensação de saciedade. Combinados, eles reduzem o apetite, por isso são moléculas-alvo para a formulação de drogas para perda de peso.
Já a molécula GEP44 simula os efeitos da cirurgia bariátrica sem a necessidade de um procedimento invasivo, afirma o pesquisador principal do estudo e professor da Universidade de Syracuse, Robert Doyle.
“Redução da quantidade de ingestão de calorias é um mecanismo que leva à perda de peso mas não só, então nós fomos atrás do mecanismo metabólico que leva a essa redução, sem ter efeitos deletérios no organismo. O que vimos foi que as mudanças produzidas por esse composto mimetizam o efeito de uma bariátrica quando há uma espécie de ‘reprogramação’ do sistema endócrino associado à perda de peso”, afirma.
Além disso, a droga não apresentou nenhum efeito colateral. “Tivemos uma incidência baixa de náusea nos ratos em experimentos mesmo com uma dose dez vezes maior da liraglutida [substância aprovada pela Anvisa para o tratamento da obesidade]”, indica o autor.
Doyle pontua que como ratos não têm a capacidade de vomitar, o tratamento foi testado também em outro modelo animal (conhecidos como shrews, em inglês), que são pequenos mamíferos insetívoros semelhantes a ratos, e que podem apresentar vômitos como sintomas.
Nestes, a droga também não provocou efeitos colaterais. Após 28 dias, os cientistas viram uma perda significativa de peso nos animais. Segundo o pesquisador, a expectativa é de iniciar os testes em humanos dentro de um período de 18 meses. A produção, escala e custos do medicamento serão comparáveis aos de outras drogas com princípios ativos semelhantes, como a liraglutida e semaglutida (presente nos medicamentos Saxenda, Wegovy e Ozempic).
Para o endocrinologista Fábio Moura, diretor da Sbem (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia), a nova molécula parece promissora por atuar na classe que os médicos chamam de agonistas triplos, isto é, que agem em três receptores diferentes do GLP-1 e dos peptídeos PYY no cérebro.
“Isto significa que vai ter uma possível ampliação de eficácia sem ampliação de efeitos colaterais, mas ainda é muito cedo afirmar porque esse estudo está ainda na fase pré-clínica [quando é testado em animais em laboratório]”, afirma o especialista.
De acordo com Doyle, outro potencial benefício da droga é que ela atua em receptores no cérebro para opioides como fentanil, que são altamente viciantes. “Esse foi um efeito completamente inesperado mas que pode ter efeito a longo prazo no comportamento de vício, uma vez que ele aumenta a janela de tempo que leva à procura da droga”, diz o autor do estudo.
Por fim, o pesquisador afirma que não foi observado o que ele chama de “compensação”, efeito comum em pessoas que passam por cirurgia bariátrica ou fazem uso de medicamentos para controle de obesidade. Nesses casos, os pacientes recuperam o peso perdido ao parar o tratamento –o chamado “efeito sanfona” ou “rebote”.
“Até o momento, não vimos a compensação como efeito da droga, o que pode indicar um mecanismo de ação nos receptores cerebrais associados à saciedade e ao apetite. A próxima etapa irá focar em investigar os genes envolvidos diretamente com a ativação de neurônios que atuam na cadeia de receptores de saciedade no cérebro”, finaliza Doyle.
O Estado de Minas