A decisão do governo de ingressar no Supremo Tribunal Federal (STF) com ação para suspender a prorrogação da desoneração de 17 setores da economia e municípios deve prejudicar as negociações com o Congresso para as aprovações da reformulação do Perse e do projeto que permite a liberação antecipada de 15 bilhões de reais em gastos extras, disseram à Reuters fontes do Congresso e do próprio governo.
A avaliação das fontes é que o clima para o avanço dessas matérias azedou, principalmente no Senado, após a investida do governo no STF para barrar a desoneração — matéria que já tinha sido alvo de um veto presidencial, posteriormente derrubado em sessão do Congresso Nacional, e que depois o próprio governo enviou uma proposta de manutenção da medida, mas com uma reoneração escalonada.
“Haverá retaliação”, disse uma fonte do PT no Senado, mencionando que parlamentares devem aumentar o impacto fiscal do programa de benefícios fiscais ao setor de eventos, o Perse.
Indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao STF, o ministro Cristiano Zanin concedeu na semana passada liminar atendendo ao pedido do governo de suspender as desonerações, o que levou o presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), forte entusiasta da desoneração, a anunciar no dia seguinte um recurso contra a decisão após falar em “erro” na investida judicial do governo.
Até o momento há cinco votos no STF para se manter a decisão de Zanin — um a menos para se formar maioria –, a despeito do pedido de vista do ministro Luiz Fux para avaliar o processo com mais tempo.
Uma fonte do Palácio do Planalto reconheceu que, ainda que o governo já tivesse aventado publicamente a possibilidade de ida ao STF, o momento para a apresentação do recurso ao Supremo não foi o melhor, logo após o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, entregar em mãos a Pacheco a proposta de regulamentação da reforma tributária — a prioridade legislativa do governo no ano.
Três fontes do Senado disseram que o impasse sobre a desoneração deve trazer consequências para a aprovação do projeto que reformula a concessão de benefícios fiscais do Perse. Na semana passada, a Câmara aprovou a proposta do governo que estabelece um limite de 15 bilhões de reais para o montante de incentivos entre abril de 2024 e fevereiro de 2027.
Contudo, a senadora Daniella Ribeiro (PSD-PB), relatora do Perse no Senado, já adiantou que vai propor alterações que devem ampliar o impacto da proposta, como a correção pela inflação. O texto deve ser votado no Senado na terça e, se aprovado, terá de voltar à Câmara.
Outra proposta importante para o governo que pode enfrentar dificuldades é a que reformula e retoma a cobrança anual obrigatória de proprietários de veículos conhecida como DPVAT. Nesse texto, que também já passou pela Câmara, foi aprovado um artigo que altera o arcabouço fiscal para antecipar de maio para agora uma liberação de gasto extra de cerca de 15 bilhões de reais para este ano.
A fonte da Fazenda reconheceu a piora da situação para o governo no Senado, mas disse que o ministério ainda está avaliando o cenário para se ter uma melhor avaliação. A fonte disse que, no caso do DPVAT, não deve haver votação contra porque já há acordo para que parte dos 15 bilhões que serão abertos para gastos extras pelo projeto sejam convertidos em emendas parlamentares.
A intenção é casar essa abertura orçamentária com a derrubada do veto de Lula às emendas de comissão, no valor de 5,6 bilhões de reais.
Outra fonte no Senado aliada ao Palácio do Planalto disse que o governo teve sorte de esta semana os trabalhos legislativos estarem esvaziados em razão do feriado de quarta-feira, Dia do Trabalho. Se não fosse, acrescentou, o Executivo corria sério risco de ser derrotado em votações no Senado.
NEGOCIAÇÃO
Diante da iminente vitória no STF com a desoneração, o governo quer usar isso como trunfo e começar a costurar uma saída negociada para o caso, segundo a fonte palaciana. O próprio Lula pediu no final de semana para se buscar uma proposta que seja um meio termo para a desoneração.
Sem alterações, a desoneração dos 17 setores e prefeituras custará aos cofres públicos este ano 15,8 bilhões de reais, segundo dados da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda.
Nesta segunda-feira, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, conversou com líderes governistas e ficou decidido que ele e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, devem se reunir com Pacheco na terça-feira para tentar começar uma negociação, disse a fonte.
A fonte considera que a busca de um acordo em torno da desoneração dos prefeitos será mais fácil. Segundo ela, há um grupo de trabalho debatendo com entidades para apresentar uma proposta aos prefeitos até o dia 20 de maio, na tradicional Marcha dos Prefeitos, e que as tratativas estão bem encaminhadas.
A dificuldade está em buscar um acerto com os 17 setores, que tem feito muita pressão, inclusive com representantes ligando para senadores.
Os dois ministros pretendem distensionar a relação com Pacheco, embora não tenham certeza do sucesso da empreitada, disse a fonte. Lula também deve se reunir com Pacheco esta semana para tratar do assunto.
Reuters